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Quem ganha com a reforma tributária?

05.09.2023


*Sérgio Wulff Gobetti






Na última terça-feira (29), o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, fez no Senado um discurso contra a reforma tributária, no qual tentou desqualificar estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), de nossa autoria, mostrando que 82% dos municípios brasileiros ganharão com as mudanças na partilha dos impostos.


"Onde está a metodologia do Ipea? Obra do achismo. Me dê os dados concretos", disse Caiado, mal instruído por assessores, sem se dar ao trabalho de ler a série de estudos em que detalhamos como chegamos aos resultados. No dia seguinte, o governador tentou remendar o equívoco, dizendo que apenas criticava "hipóteses simplificadoras e pouco realistas". E afirmou que a média de crescimento econômico de 2,5% ao ano, que adotamos para projetar as receitas futuras, "nunca foi registrada na história nacional".


Mais um erro. Nos últimos 50 anos, a taxa média de expansão do PIB foi de 3%. Logo, não há "irrealismo" em projetar crescimento de 2,5%, ainda mais depois de uma reforma que aumentará a produtividade, como reconhecido por 90% dos economistas.


Mesmo em cenário pessimista, com PIB crescendo 1,5% ao ano, as simulações indicam que no máximo 32 municípios (três em Goiás) correriam o risco de ter queda de receita. A maioria dos municípios goianos, além de não ter queda, terá ampliação de sua participação no bolo, principalmente com o novo imposto municipal sobre bens e serviços que será criado em substituição ao ISS.


No conjunto, a participação dos municípios de Goiás no bolo tributário deve crescer quase 20%. As cidades que mais ganham são as mais pobres, como as do entorno de Brasília, com pouca produção, mas grande população. Como a reforma vai transferir a receita dos municípios em que estão instaladas as empresas para aqueles em que ocorre o consumo, é natural que tais cidades sejam beneficiadas. Já os municípios que mais produzem, como Rio Verde, continuarão tendo aumento de receita, mas em menor ritmo do que hoje. No cenário pessimista, Rio Verde veria sua receita de ISS e ICMS crescer de R$ 389 milhões para R$ 605 milhões em 50 anos. No cenário otimista, chegaria a R$ 998 milhões. É natural haver dúvidas diante de mudanças na forma como os estados atuam para atrair investimentos, mas não há provas de que os atuais benefícios fiscais sejam tão positivos para a economia goiana como diz Caiado. Há estudos do Instituto Mauro Borges (IMB), realizados a pedido da Secretaria de Fazenda que apresentam indícios de ineficiência.


"Tal instrumento de política fiscal abre espaço para que grupos de interesse pressionem as autoridades locais a chancelarem privilégios, restringindo a concorrência", diz o IMB em relatório de 2019, no qual destaca que, entre as cinco empresas que mais recebiam benefícios em Goiás, duas registravam custo anual R$ 387.292,41 e R$ 170.064,68 por cada emprego. O maior custo verificado na pesquisa foi de uma empresa farmacêutica: R$ 13.441.451,53 para 11 empregos - uma média de R$ 1.221.950, 14. É muito dinheiro para pouco resultado. A quem interessa manter isso?


*Sérgio Wulff Gobetti, doutor em Economia, ex-secretário-adjunto de Política Fiscal e Tributária do Ministério da Fazenda, é economista do - Instituto de Pesquisa Económica Aplicada (O Popular)

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